Nos tempos da formosa Tiazinha

Tempos atrás, o termo "tiazinha" designava mulheres com mais de trinta, meio passadinhas, que, insistindo em permanecer na idade do flerte descompromissado, envolviam-se com rapazolas efêmeros — volúveis representantes da fase hormonal. "Fulano agarrou uma tia-zinha ontem... vou te contar"; "Beltrano traçou aquela tal tiazinha, lembra?"; "Sicrano não quis mais saber; mandou a tiazinha passear" — eram construções corriqueiras entre os fanfarrões dessa época.

Hoje em dia, meu amigo... Hoje em dia, Tiazinha é mulher boa! Com, no máximo, vinte; vinte e poucos... Do tipo que faria Zé Trindade se contorcer, caretear e, por fim, exclamar com profundidade e sapiência: — "O que é a Natureza..."

Bundas à mostra ou não, o fato é que o Brasil sempre precisou ter lá as suas namoradinhas. Fazer o quê se, com o passar dos anos, elas foram ficando mais peladas, mais desavergonhadas e mais objetivas? Assim como o povo que as patrocina, não querem mais saber de preliminares e de intermediários. "Minha filha, você me faça o favor de pôr o traseiro na câmera e rebolar. Requebra, requebra che ti fa bene."

É a ordem. É a lei. É a melancolia do mundo. O brasileiro resolveu estender os limites da sua adolescência, decotando-se na mais tenra infância e posando de gostosão recauchutado, quase pedófilo, depois dos cinqüenta. Nosso dramaturgo-mor costumava afirmar que o homem é o menino perene. Se vivo fosse, haveria de convir que, décadas depois, nossos compatriotas estão mais para eternos amadurescentes. A maturidade, mais do que o futuro, é o que parece não chegar por aqui.

Será culpa dos Anos Sessenta, do Poder Jovem, de Woodstock, da pílula e dos pais da liberdade individual e incondicional (que insistem em demolir tudo o que pode haver de sólido, certo e definitivo)? Muito atraente essa idéia de fazer do stablishment, do status quo e dos ideais burgueses, terra arrasada. Acontece que feita a "limpa", feito o balanço, não sobraram muitos valores dignos para se cultivar. Ou sobraram?

Ficaram só essas fomes que se revezam. Um hora é a gastro-intestinal, outra a reprodutiva. Predominando a consumista. Fica a cabo da mídia e do mercado, o abastecimento desse imaginário de ilusões, delírios e desejos — que criaram essas multidões ávidas, insaciáveis e rastejantes, que imploram pela pseudo-novidade, pela emoção pré-fabricada e pelo falso-ineditismo; recheados, é claro, de clicheria estridente.

Essa pobre aí, essa que não sabe nem responder às mais elementares perguntas, essa impudica Suzana Alves, não é mais que bucha de canhão. Lamentavelmente vai acabar ou em silicone, ou em amante de jogador de futebol, ou em partidária da causa evangélica. Para não falar em outras calamidades.

Não traz nada de diferente. Seu mérito estaria talvez em desbancar o carnaval carioca, dividindo a ribalta com a nada casual Adriane dos Filisteus. Esse papo de chicote, máscara, cinta-liga, isso não tem qualquer implicação simbólica, sociológica, mítica. É um absurdo que se queira explicar ou entender alguma coisa por esse viés. O que há com os nossos "intelectuais"?

É o corpo pelo corpo, é o erotismo pelo erotismo, é a vulgaridade pela vulgaridade. A indumentária, nesse caso, é tão dispensável quanto foi a banheira para a moça que catava sabonetes; os negrões e as danças, para as garotas do Tchan; a eleição de bumbuns, para a substituta da Perez; a música, para a Gretchen; o Chacrinha, para a Rita Cadillac; a passarela do samba, para a adesiva Globeleza.

O irônico é que essas manifestações, por vezes, escandalosas não asseveram nosso caráter festivo, alegre e "cheio de vida". Pelo contrário. Desvelam nossa alma penada, mostrando que, na prática, estamos muito aquém da imagem que queremos exportar. Revelam que somos uns tremendos de uns carentes. Exorcizamos o desamor, a má sorte, a incompetência, a pobreza e os constantes insucessos nacionais pela ebulição desenfreada, pela catarse, pela explosão do que pretendemos, do que almejamos, do que acreditamos ser nossa razão primeira, nossa identidade, nossa cara, nosso way-of-life.

Se fôssemos assim tão felizes não precisaríamos de revigorantes folias em que as pessoas vão para "se acabar" (algumas literalmente, como mostra o saldo de mortos e feridos). A verdadeira plenitude não está ligada a eventos disparatados, mas à rotina equilibrada, produtiva e prazenteira. A chave está na constância, na perseverança, na harmonia, na certeza, não em picos artificiais, em festejos arbitrários, sem motivo e sem porquê.

Feliz é quem vive a felicidade de cada dia, sem esperar por períodos em que possa se esbaldar irresponsavelmente e sem se ancorar no passado que não volta. Enquanto não se compreender isso não se sai do lugar, fica cada um atirando pra um lado, garantindo o seu, abocanhando sua desproporcional fatia — pisando em quem está embaixo e puxando o pé de quem está em cima.

Que tal parar com esse imediatismo, com esse gozo frívolo e desesperado? Que tal começar a raciocinar mais a longo prazo?

Afinal, o mundo não acaba amanhã. Afinal, o Brasil é bem mais que algumas bundas formosas.

J. D. Borges