Ratinho — o homem que não leu nenhum livro inteiro

Tá na Caras!

Tá na Veja. Tá na Amiga. Tá na IstoÉ. Tá na Contigo. Tá na Manchete. Tá na Época. E está na sua casa também.

Ex-lavador de cadáveres, ex-vendedor de laranjas, ex-operador de raio-X, ex-radialista, ex-repórter, ex-deputado federal, atual apresentador, assumido picareta, Carlos Roberto Massa, o "Ratinho", assina o contrato mais alto da História da Televisão Brasileira e causa celeuma na Imprensa, na intelectualidade, na ralé e na sociedade.

O Ratinho Caseiro

E lá está o nosso homem-família, posando para revistas de fofocas, em seu recém-adquirido dúplex curitibano de 800 m2, com os pés descalços, ao lado da mulher, à qual se diz submisso, e ao lado dos filhos — que, herdeiros da sua impetuosidade, ironizam o fato de Silvio Santos ter de engoli-lo agora por mais de um milhão de reais mensais. (Quando podia tê-lo feito, há meses, por dez vezes menos "cascaio".)

(Como se entoasse o coro dos intragáveis, Ratazana posa também ao lado de Zagalo.)

O Ratinho Revolucionário

E lá está o nosso idealizador do televisivo-popularesco, do ostensivo-brega, do barbarismo-irrefreável. Em recente coletiva, anuncia uma programação verdadeiramente piegas, voltada para o mais autêntico povão.

Povão esse que teve sempre suas vontades relegadas ao último plano. Povão esse que sofreu violentas injunções do "bom gosto" dos mais abastados.

(Ratazana promete mais atrocidades estéticas e plásticas — como se a profusão de Sheilas, sertanejos, pagodes, ETs, Hebes, Xuxas e Sashas já não bastassem.)

O Ratinho Altruísta

E lá está o nosso auto-intitulado assistente-social, defensor dos deformados, dos rotos, dos esfarrapados. Se necessário for, invoca, em seu programa, até Ministro da Saúde — supostamente ocupado.

Para muitos dos desvalidos, Ratinho fez-se sinônimo de salvação e de cura. Seu creepshow transformou-se numa espécie de "Porta da Esperança" dos desesperados.

Exibindo e expondo seus desafortunados em horário "nobre", Ratazana converte o choque com a realidade em picos de Ibope — e em soluções pessoais bastante questionáveis.

(Informa que resolve, em média, 80% dos casos de pessoas que o procuram desenganadas.)

O Ratinho de Laboratório

Para os teóricos da telinha, Ratazana não passa de mais um fenômeno cíclico — tendo assim seus dias contados.

Acreditam os nossos estudiosos que El Ratiño é apenas reflexo de uma onda de debilidade que vem varrendo igualmente os canais de comunicação da avançadíssima América do Norte. Atestam seu caráter efêmero, baseando-se na ascenção e queda de atrações circenses de mesmo calibre; tais como "Aqui Agora", "O Povo na TV" e "Cadeia" (em que Ratinho atuou como aprendiz de estagiário).

Já para os experts da telinha capitalizada, El Ratiño é um filão a ser explorado até sua total exaustão. Portanto, prepare-se, ó telespectador, para uma saraivada de emoções fortes; para mais um turbilhão barbaridades.

(Tenha em mente que a concorrência promete armar-se à altura — e voltar à carga.)  

Nós, as Cobaias

Voltaremos ao Império Romano. Voltaremos ao Coliseu Romano. Voltaremos à Era dos Gladiadores.

Vem aí autópsia, necropsia, escatologia, pedofilia, distrofia, polimorfismo, fanatismo, belicismo, antropofagia, nanismo, zoomorfismo, vulgarismo e acefalia.

Mas pior do que assistir a esse espetáculo de degradação e histrionismo, é concluir que cada povo tem — além do governo — a televisão que bem merece.

J. D. Borges